quinta-feira, 24 de abril de 2014

Quatro ascetas do séc. XVI


Sabe-me bem passar uns minutos diante das estantes, espalhando os olhos pelas lombadas dos meus livros. 

Acabo, sempre, por descobrir algo de novo, o que me surpreende, quando se trata de novidades sobre obras que, nalguns casos, me acompanham há mais de cinquenta anos e têm sinais de basta manipulação.

Hoje chamou-me a atenção um pequeno opúsculo, de 1950, editado pela Livraria Simões Lopes, do Porto, em que a autora, Maria do Céu Novais Faria, junta textos escolhidos de Quatro Prosadores Ascetas do séc. XVI – o tempo da questão dos Judeus em Portugal, da Inquisição, de Alcácer Quibir, da perda da independência de Portugal e da publicação dos Lusíadas.

A escolha de textos dos quatro mais consagrados prosadores ascetas deste período, para compor uma pequena antologia, não é tarefa fácil, mas foi bem conseguida pela autora. 

Começando por Frei Heitor Pinto (n. 1528), teólogo e Prof. da Universidade de Coimbra, cuja obra principal – Imagem da Vida Cristã –, é notável pela escolha dos temas e a construção dos diálogos, de grande valia literária, como provam as diversas edições em latim, castelhano, francês e italiano.

Frei Amador Arrais, nascido em Faro, ou Beja, entrou para a Ordem dos Carmelitas Descalços (1545), foi Doutor, em Teologia, por Coimbra, coadjutor do Cardeal D. Henrique, Arcebispo de Évora, Bispo de Trípolis e, nomeado por Filipe, de Espanha, Bispo de Portalegre. 

Tal como Frei Heitor Pinto, este asceta escreveu diálogos, de que destacamos a obra “Da Glória e Triunfo dos Lusitanos”, em que faz um breve resumo da História de Portugal, desde a Fundação da Nacionalidade.

Samuel Usque, judeu português, de que a principal obra “Consolação às tribulações de Israel”, publicada em Ferrara (Itália), em 1553, encantadoramente dividida em três diálogos, visando “consolar os Judeus das tribulações da época e inspirar-lhes confiança nas promessas do Senhor”. Ressalta da obra o amor, sentimento e visão poética da natureza e os três maravilhosos quadros da vida pastoril.

Frei Tomé de Jesus, é, dos quatro ascetas, o mais nobre, de nascimento, cuja família, abastada e intelectualmente distinta, o viu professar, no convento da Graça e partir para África, escolhido por D. Sebastião, para a expedição a Alcácer Quibir. 

Aprisionado e atormentado, viria a morrer, nas masmorras, em 1582, onde escreveu, às escondidas, “Os Trabalhos de Jesus”, cujo prefácio “Carta à Nação Portuguesa” é um verdadeiro hino às virtudes heróicas dos santos. 

Termina assim a carta: Deste cativeiro de Marrocos, e do indigno companheiro dos cativos atribulados pelo nome do atribulado Jesu, o vosso português frade indigno dos Eremitas de Santo Agostinho. A 8 de Novembro de 1581. Frei Tomé de Jesu.


Leia estes Mestres, que nunca foram prémios Nobel, embora fossem exímios a escrever. 

Não lhes faltou nobreza nem sabedoria; porém morreram humildes e dignos dos que sempre respeitaram.

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