Aguadouro do avô
Esta
imagem, encontrada há dias, na Internet, trouxe-me à memória uma conversa com o
meu avô, lá pelos anos cinquenta, do século passado.
Havia
duas situações em que se usava o aguadouro: Quando o terreno a regar se situava
a nível superior à levada da água, ou para certas plantas onde este tipo de
rega era recomendado (por exemplo os alfobres das couces, tomates, cebolas,
alfaces, etc.).
Por
uma prisão da água, fazia-se uma pequena poça e, com o aguadouro, que o meu avô
pronunciava “ogadouro”, lançava-se a água sobre as plantas, em vez de deixá-la
correr por cima da terra para dentro das belgas (pequenos tanques).
Aplicava-se, por vezes, no feijão-verde, nalgumas couves, alfaces e almeirões
e, dum modo geral, nos alfobres, ditos “canteiros” lá na terra, que são os
viveiros de plantas hortícolas para fazer transplantações, em produções
definitivas.
Como
este tipo de rega era trabalhoso, usava-se o artifício que mais tarde se veio a
generalizar nas culturas intensivas: cobria-se o terreno da cultura com palha,
juncos, fetos, ou caniços, cortados nas ribeiras, ou valados, junto das hortas
onde eram aplicados. Eram precisas menos regas.
Até
aqui tudo bem; eram as explicações que eu solicitava ou que, por antecipação,
meu pai e meu avô me faziam, quando vinham a propósito. Atribuo a estes
pequenos episódios, uma das causas que deram origem à minha curiosidade
habitual.
Dizia
o meu avô: “com certeza, não vão ser estas as canetas que vais usar, mas vais
encontrar muitos doutores que não conhecem estas coisas e uma coisa é certa: o
saber não ocupa lugar, mas se não se souber, esses lugares ficam vazios, ficam
ocos e isso nota-se”.
Recordo
ainda que, mais o meu avô que o meu pai, correspondiam, dentro das suas
limitações, às minhas perguntas e, inteligentemente, aproveitavam para ensinar
o que era suposto não saberem, dada a sua condição de iletrados. Nunca os
considerei analfabetos, para além da impossibilidade que tinham de não saber
ler e escrever.
Faziam
as contas à sua maneira, tomavam notas com os seus sinais, assinavam
compromissos com a sua palavra, liam as necessidades do trabalho com a sua
experiência e… romperam com toda a carga genética e atávica de aceitarem
resignadamente o futuro dos netos e filhos, afirmando: serão, não o que trazem
do berço, como nós e todos os que antes de nós trouxeram, mas o que a vida lhes
puder dar.
Um
dia, num negócio de venda de pinhal, meu pai pediu a minha opinião e, fazendo
questão de justificar essa atitude, explicou: aqui o meu filho anda ainda há
pouco tempo no colégio, mas já não se fica pelas perguntas; a partir de agora
também passa a respostas. Não leve a mal, senhor Aparício..
O
madeireiro apenas disse: parabéns, amigo Valente, viu que quem conduziu todo o
negócio foi o meu filho? Apreciei a sua atitude e tenho a certeza que nunca se
arrependerá. Força rapaz; a vida é tua!...