quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

A frágua e o barroco



“Ao volver da Quelha, passei ali pela frágua do Manuel Domingos, acá umas boas jardas do Barroco Gordo e acertámos para amanhã, ao nascer do sol, uma passagem para calçar as vacas.”

Esta e outras frases, causaram-me certa estranheza nos primeiros tempos em que, ido de Lisboa, depois de criado nas terras da Beira Baixa, comecei a frequentar a casa da família da minha mulher, nos contrafortes da Serra da Estrela, nos lados da raia com a Espanha.

Sempre fui leitor aturado dos livros de Mestre Aquilino Ribeiro e, bastas vezes, confirmei nos dicionários de que sou consultor compulsivo, o significado dos termos mais vernáculos, ou simplesmente regionalistas, que ia encontrando. 

Hoje acho graça às anotações, que nessa época escrevi nos livros, quando, não raro, os releio.

Vim a constatar que o linguajar das “Terras do Demo” é, exactamente, o que o Mestre transcreve nos seus livros. 

E não se trata, afinal, de barbarismos, ou vernaculidades balofas; regista-se a língua viva e palpitante das gentes da Beira Alta. 

Não é com qualquer espírito, menos isto, ou mais aquilo, que se emprega a segunda pessoa do plural dos tempos dos verbos e se emprega, com muito mais a propósito, a forma bem-haja, em vez de muito obrigado, para agradecer.

Mas voltemos às palavras do António Preizal – assim chamado por ser natural da aldeia do Paraísal, nas arribas do Côa – com que iniciámos esta dissertação.

Quando diz que passou pela  frágua, está, correctamente, a referir-se à oficina do ferrador, que tem uma forja para preparar as ferraduras das bestas e os canelos dos bois e vacas.

Até então a palavra frágua era, para mim desconhecida. 

Pensei que se tratasse de uma corruptela de fraga, mas o dicionário desfez-me as dúvidas e não era única a expressão tronco, utilizada na minha terra para identificar o local onde se ferravam os animais.

Acá é uma forma arcaica, mas perfeitamente em uso na região, e muito precisa para o significado que se lhe atribui: para cá.

A palava barroco é aplicada, com toda a propriedade, nas terras da Beira Alta: penedo isolado e informe, ao contrário da Beira Baixa onde se emprega como sinónimo de barroca: escavação natural ou barranco

Mais uma vez, os significados correctos, segundo as fontes consultadas, são os usados nas terras onde, por adopção, me considero como nas minhas próprias origens.

Será interessante que, sociologicamente, se justifique esta pureza de linguagem e se confirme, ou negue, a afirmação, muitas vezes ouvida, de que a região onde melhor se fala o português é a das Beiras Alta e Litoral. 

Afinal as terras, magistralmente descritas por Mestre Aquilino.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Cuco



O cuco-canoro, cuco-vulgar, corredor, sacis, cuco-cinzento, etc., cujo nome: cuculidae, pertencente à família das aves cuculiformes

Tem cerca de palmo e meio de comprimento e quase três palmos de envergadura, pesando até 130 gramas; cada asa mede entre 23 e 25 cm. 

Em voo – o que não é muito vulgar -, mostra asas afiadas, cauda comprida e cabeça pequena, lembrando uma ave de rapina. 

Pousado, nos ramos de árvores, parece desajeitado e desproporcionado, com dificuldade de fechar as asas. 

As cores predominantes são o cinzento, no peito e na parte superior e, na parte inferior listas brancas e pretas. 

Os jovens são mais escuros e têm mais listas, que se estendem, também, à parte superior. 

Há, especialmente no Alentejo, uma variedade – o cuco-rabilongo -, a espécie mais numerosa, depois do cuco-comum. É voraz e predador de outras aves. 

O cuco adulto alimenta-se de insectos: aranhas, larvas e, principalmente, da processionária dos pinheiros. Enquanto jovem é alimentado pelos pais hospedeiros, com insectos, pequenos frutos e até grãos diversos. 

O cuco distribui-se por toda a Europa (referenciado em 37 países), onde passa o Verão, migrando após a postura dos ovos, para os bosques equatoriais da África. 

Os filhos só partem em Agosto/Setembro, sem nunca conhecerem os pais. 

Os cucos voam, de noite, isoladamente e os novos têm um sentido de navegação que lhes permite sobrevoar o deserto do Sara, antes de chegar ao seu destino. 

O cuco é o exemplo clássico de parasitismo, nas aves (não constrói o ninho, não incuba os ovos e não alimenta os filhos). 

A mãe-cuco, procura ninhos de aves mais pequenas – arvéloa, rouxinol dos caniços, toutinegra, etc. – cujos ovos são parecidos com os seus, e em cerca de 48 horas, põe 12 ou 13 ovos, um em cada ninho, por substituição de um dos ovos que lá encontra. 

A incubação do ovo do cuco demora apenas 14 dias, pelo que os cucos serão os primeiros a nascer no ninho. 

A primeira coisa que fazem é deitar fora os ovos que encontrem, ou até aves recém-nascidas, ficando sozinhos com todo o espaço e alimento que os pais-adoptivos levem. 

O característico e repetitivo cuc-cuu – origem do onomatopaico nome -, assinala o princípio da Primavera (Março /Abril de cada ano).

Nota: Há outros "cucos", sem penas nem asas, que seriam óptimos exemplos de parasitismo, mas dado o requinte dos seus processos, não se enquadram nas coisas simples que são, por norma, o objecto dos meus escritos.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Líder - liderança


A palavra “líder” é a grafia portuguesa da palavra inglesa “leader” – chefe -. 

Derivada de líder formou-se “liderança”- qualidade ou função de líder. Forma de dominação baseada no prestígio pessoal e aceita pelos dirigidos. (G. D. da Língua Portuguesa – Dr. J.P.Machado). 

Há líderes desde que o Mundo é Mundo; todavia a maior parte dos dicionários que consultámos não contém essa entrada. 

Usavam-se muitas outras palavras, ou expressões, para designar os chefes, os comandantes e os dirigentes. 

Talvez não fosse muito sentida a necessidade de massificar a palavra, pois os verdadeiros líderes não abundam, quer nos refiramos às classes sociais, aos grupos económicos ou aos dirigentes políticos. 

Mas com o apogeu das sociedades industrializadas e o consequente aparecimento das técnicas de Marketing, surgiram as oportunidades de generalização de grupos comerciais agressivos e apareceram os líderes. 

Pessoas que, pela sua personalidade, exercem influência sobre o comportamento dos outros, conduzindo-os na acção e representando-os nas suas pretensões e opiniões. 

Também na política o líder é a pessoa que chefia um grupo político – partido –, ou um movimento, e os representa, institucionalmente. 

Ao falarmos de líder, referimo-nos à personalidade. 

Efectivamente , umas das primeiras condições do líder, como chefe e como dirigente, deriva da sua personalidade. 

Vem, depois, um vasto conjunto de atributos que exercem influência sobre o grupo que acaba por reconhecer o líder – chefe incontestado e aceite, incondicionalmente, por todos. 

O líder tem de:

- Ter um comportamento irrepreensível, saber ouvir, ponderar e decidir; 

- Incentivar, premiar e saber ajudar, ou mandar apoiar, os que precisem; 

- Caminhar, resolutamente, para os objectivos que traça, ou recebe; 

- Rodear-se dos mais capazes e motivar os menos aptos; 

- Captar as tendências, aspirações, interesses e motivações do grupo e materializá-las; 

- Analisar as acções dos concorrentes, ou adversários, criteriosamente e separar o que é passível de combate, do que não é atacável; 

- Eleger a árvore no meio da floresta; 

- Elogiar ou admoestar, mas sempre com um carácter didáctico e construtivo; 

- Motivar os seus sequazes, com envolvimento e motivação, nas tarefas a desempenhar. 

E, se para dentro do grupo o líder nunca se pode abster da sua condição, para o exterior a tarefa é muito mais melindrosa: 

- Não pode, em circunstância alguma trair a expectativa que os seus seguidores têm dele próprio, como líder; 

- Não pode pactuar com falhas na execução das tarefas executadas; 

- Não pode dizer mal, abertamente, das acções do adversário e sempre que a tal se refira tem de adoçar a agressividade que tenha usado com alternativas válidas, exequíveis e realistas. 

- Tem de ser visto como líder, também pelos adversários; 

- E tem de ter sempre presente que a liderança se conquista e mantém ao longo duma vida e se perde num simples acto irreflectido, mal amadurecido ou simplesmente falhado.