“Ao volver da Quelha, passei ali
pela frágua do Manuel Domingos, acá umas boas jardas do Barroco Gordo e
acertámos para amanhã, ao nascer do sol, uma passagem para calçar as vacas.”
Esta e outras frases, causaram-me
certa estranheza nos primeiros tempos em que, ido de Lisboa, depois de criado
nas terras da Beira Baixa, comecei a frequentar a casa da família da minha
mulher, nos contrafortes da Serra da Estrela, nos lados da raia com a Espanha.
Sempre fui leitor aturado dos
livros de Mestre Aquilino Ribeiro e, bastas vezes, confirmei nos dicionários de
que sou consultor compulsivo, o significado dos termos mais vernáculos, ou
simplesmente regionalistas, que ia encontrando.
Hoje acho graça às anotações,
que nessa época escrevi nos livros, quando, não raro, os releio.
Vim a constatar que o linguajar
das “Terras do Demo” é, exactamente, o que o Mestre transcreve nos seus livros.
E não se trata, afinal, de barbarismos, ou vernaculidades balofas; regista-se a
língua viva e palpitante das gentes da Beira Alta.
Não é com qualquer espírito,
menos isto, ou mais aquilo, que se emprega a segunda pessoa do plural dos
tempos dos verbos e se emprega, com muito mais a propósito, a forma bem-haja,
em vez de muito obrigado, para agradecer.
Mas voltemos às palavras do
António Preizal – assim chamado por ser natural da aldeia do Paraísal, nas
arribas do Côa – com que iniciámos esta dissertação.
Quando diz que passou
pela frágua, está,
correctamente, a referir-se à oficina do ferrador, que tem uma forja para
preparar as ferraduras das bestas e os canelos dos bois e vacas.
Até então a palavra frágua era,
para mim desconhecida.
Pensei que se tratasse de uma corruptela de fraga, mas o
dicionário desfez-me as dúvidas e não era única a expressão tronco,
utilizada na minha terra para identificar o local onde se ferravam os animais.
Acá é uma forma arcaica,
mas perfeitamente em uso na região, e muito precisa para o significado que se
lhe atribui: para cá.
A palava barroco é aplicada, com
toda a propriedade, nas terras da Beira Alta: penedo isolado e informe,
ao contrário da Beira Baixa onde se emprega como sinónimo de barroca:
escavação natural ou barranco.
Mais uma vez, os significados correctos,
segundo as fontes consultadas, são os usados nas terras onde, por adopção, me
considero como nas minhas próprias origens.
Será interessante que,
sociologicamente, se justifique esta pureza de linguagem e se confirme, ou
negue, a afirmação, muitas vezes ouvida, de que a região onde melhor se fala o
português é a das Beiras Alta e Litoral.
Afinal as terras, magistralmente descritas por Mestre
Aquilino.
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