quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

O tempo e a maneira


Diga-me uma coisa, senhor professor!...: 

Então para escrever uma lauda destas, não demora muito tempo, pois não!?... 

É que a gente nunca fôramos mandados à Mestra que, quando eu fui garoto, aqui deu escola. E uma das coisas que ainda gostava de ser capaz de fazer, antes de morrer, era apresentar assim umas ideias que trago na cabeça vai para um ror de anos e de várias maneiras.

Vem ao propósito uma práctica que numa das Quaresmas o padre de fora deitou do púlpito, sobre o tempo em que as coisas se fazem e a maneira como são feitas:

 Todos sabemos que o tempo não é igual para todos: começa ao vir a este mundo, ou a tempo ou fora de tempo; no tempo bom ou com frio e fome. Já quanto a maneiras também é cada coisa de seu feitio: uns são paridos como outro qualquer animal e outros nascem rodeados de médicos e enfermeiras, cercados de cuidados e aconchegos.

E se Deus, que é Deus e pode tudo, nasceu lá num palheirito e foi aquecido pelo burro e pela vaca, que para ele o tempo devia estar frio como para qualquer outro, naqueles dias de Natal, como podemos nós não aceitar o que a sorte nos guardou para nós? E estes nós, somos todos; os que pensam que podem fugir, tropeçam e caem.

Eu não ponho em causa o que todos temos de mais certo, como dizia um velho que havia aqui na terra e eu ainda cheguei a conhecer, a quem chamavam o ministro, talvez porque fosse muito examinado e gostasse de dar doutrinas. 

Dizia ele: tenho a certeza absoluta que nasci e hei-de morrer!...Mais nada!

Às vezes, acrescentava: tão certo como eu dizê-lo é poder garantir que ainda ninguém foi capaz de me contrariar, ou chamar-me mentiroso. 

Mas, quanto ao tempo e à maneira também ainda ninguém me soube esclarecer. É que mesmo os que estudaram muito ainda não foram capazes de alterar a ordem natural das coisas que umas vezes se resolvem pela força e outras pela falta dela.


Estas são algumas das coisas que gostava de poder ter escrito, senhor professor. 

Se não, um dia, como dizemos do ministro, hão-de dizer que eu dizia…e mais nada!.

1 comentário:

Anónimo disse...

LK - Deliciosa essa sua história professor José Valente. A simplicidade, a linguagem e a picardia são muito da gentes da nossa terra em tempos ainda não distantes.