A sátira e a ironia aparecem tão bem jogadas nas quadras de António Aleixo que revelam, pelo menos, o domínio de certos enquadramentos e raciocínios lógicos, indiciadores de treino intelectual e muita leitura.
A simplicidade com que se exprime e o rigor cirúrgico com que manipula e resume as ideias, evidenciam largas horas de leitura e, sabendo nós que um dos livros que mais utilizava era o dicionário, grande domínio das palavras.
A maior profundidade é alcançada em quadras e, até mesmo, em versos isolados, que nada mais fazem, depois, que dar cor aos quadros que pintam.
E, na simplicidade e beleza dessas imagens, na realidade e clareza dessas observações, reside a subtileza da sua obra, em que raramente se lê uma palavra menos comum, ou de difícil compreensão.
Algumas pérolas:
A mosca
Uma mosca sem valor
Poisa com a mesma alegria
Na careca de um doutor
Como em qualquer porcaria.
Ironia
Julgando um dever cumprir
Sem descer no meu critério
Digo verdades a rir
Aos que me mentem a sério.
Trocadilho
Entre leigos ou letrados
Fala só de vez em quando
Que nós às vezes calados
Dizemos mais que falando
Jogo de palavras
P’ra não fazeres ofensas
E teres dias felizes
Não digas tudo o que pensas
Mas pensa tudo o que dizes.
Imponderabilidade
Quem prende a água que corre
É por si próprio enganado.
O ribeirinho não morre
Vai correr para outro lado.
Destino, fatalidade
Vinho que vai p’ra vinagre
Não retrocede o caminho.
Só por obra de milagre
Pode, de novo, ser vinho.
Sem comentários:
Enviar um comentário