Quando uma história começa a bailar no pensamento, acaba por perturbar o desenvolvimento normal de qualquer escrita com cabeça, tronco e membros. Assim como o gato e o rato, aparece, desaparece, volta a aparecer, no meio da sequência do que estamos a escrever.
Nestes casos o melhor é fazer um parêntese, escrevendo o que anda a querer saltar, para que acabe por sossegar e ficar, em suspenso, até que, um dia, ou nunca, se pegue nisso e se avance com a ideia.
Como se as personagens estivessem sossegadas e, uma vez desassossegadas, tenham necessidade de ser acalmadas. Ou como uma criança que chora sem causa física aparente e está, tão só, a pedir a nossa atenção, ou a solicitar o nosso carinho. Uma vez atendida deixa de haver causa para o choro e vem o sossego.
Porém, não se julgue que este sentimento de frustração é raro e só ataca os mais carenciados, ou com espíritos mais sensíveis. A ausência, ou demora da satisfação de uma coisa, material ou sentimental, tem, sobre o ego e o sistema de auto-estima, um efeito potenciado que, enquanto não satisfeito, funciona como força de bloqueio e se manifesta das mais variadas formas, mais ou menos obsessivas.
Comprar um jornal é um acto reflexo, ou, se quisermos, um hábito.
Enquanto o não temos, sentimo-nos incomodados com a carência dele e somos alertados por um alarme que, de tempos a tempos, e a intervalos cada vez mais curtos, nos lembra essa falta.
Porém, depois de comprá-lo, quase não olhamos para ele, ou nem o chegamos a ler.
As novidades da moda, os saldos ou, por exemplo uma viagem, são estímulos idênticos, que provocam reacções similares.
É certo que ao contrário dos discos rígidos dos computadores, que armazenam tudo o que lhes enviamos, o nosso cérebro tem poder selectivo e acaba por não estourar, ou crachar, por excesso de dados.
É um prodígio da Natureza, mas um pouco de método não fará mal e podemos enviar mensagens classificativas e definidoras da prioridade, ou do que é secundário e supérfluo.
Todavia, se pensamos que isso é simples e linear, estamos enganados.
Teoricamente será tão difícil lembrar como esquecer, embora a maior parte da nossa intervenção consciente seja no sentido de retermos o que admitimos e consideramos interessante, quer lendo mais que uma vez o que queremos fixar, quer usando formas de desenvolvimento da memória e pouco ou nada fazermos para treinar o esquecimento.
Somos, isso sim, máquinas muito perfeitas e com uma grande capacidade.
Então o que será um esgotamento? Qual será, então, o papel do método? E o que é, de facto, o método?
PS – Esta “Folha solta” ultrapassa, um pouco, a simplicidade que me imponho quando escrevo estes pequenos ensaios. Que me desculpem os leitores.
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