terça-feira, 29 de maio de 2012

João de Deus



Depois da infância, em S.Bartolomeu de Messines, onde se iniciou no estudo do latim, João de Deus, o 4º de 14 irmãos, partiu para o Seminário de Coimbra, aos dez anos. 

Aos 19 deixou o Seminário e ingressou na faculdade de Direito da Universidade da cidade do Mondego, mas apenas dez anos depois, quase a completar 30 anos, viria a terminar o curso. 

Sempre se dedicou mais às artes do que ao estudo do direito, vivendo muitas vezes em situações de quase indigência, pois os rendimentos das traduções, poesias, colaborações literárias e outros expedientes, eram fracos. 

Numa das tertúlias, em que mais uma vez se destacou na defesa do amigo, Antero de Quental, começaram a apoiar o poeta e foi decidido que seria reunida e divulgada a obra de João de Deus, reconhecendo-lhe o devido e justo valor. 

Surgiu também a ideia de uma candidatura a deputado às Cortes, o que lhe permitiria, pelo menos, viver. 

Esta ideia foi avante e João de Deus acabou eleito, em 1868, pelo círculo de Silves. 

Sobre o Parlamento, a imprensa da época atribuiu a João de Deus as seguintes considerações: 

…”Que diacho querem vocês que eu faça no Parlamento? Cantar? Recitar versos? Deve ser (…) gaiola que talvez sirva para dormir lá dentro a ouvir música dos outros pássaros. Dormirei com certeza!”



Dia de anos

Com que então caiu na asneira   
De fazer na quita feira
Vinte e seis anos! Que tolo!
Ainda se os desfizesse…
Mas fazê-los não parece
De quem tem muito miolo!

Não sei quem foi que me disse
Que fez a mesma tolice
Aqui o ano passado…
Agora o que vem, aposto,
Como lhe tomou o gosto,
Que faz o mesmo? Coitado!

Não faça tal; porque os anos
Que nos trazem? Desenganos
Que fazem a gente velho:
Faça outra coisa; que em suma
Não fazer coisa nenhuma,
Também lhe não aconselho.

Mas anos, não caia nessa!
Olhe que a gente começa
Às vezes por brincadeira,
Mas depois se se habitua,
Já não tem vontade sua,
E fá-los queira ou não queira! 








No 1º ano, assistiu, regularmente, sem grande colaboração, às sessões; no ano seguinte acabou por faltar a 10 das 13 sessões realizadas.

O casamento, o nascimento dos três filhos e a passagem pelas Cortes, acabaram por criar estabilidade na sua vida pessoal e uma maior disponibidade para publicação sistemática da obra poética e dramática.

Depois, Teófilo Braga reuniu e organizou os textos, acabando por sair, em 1893 – 3 anos antes da morte de João de Deus – a obra Campo de Flores.

Nos últimos anos de vida continua a colaborar, activamente, na imprensa periódica, a fazer traduções e adaptações. 

Já, em 1880, por influência do seu grande amigo Antero de Quental, escreve no jornal católico Cruz do Operário uma carta, dizendo que: 


“é socialista porque é cristão, e socialista porque ama os seus semelhantes…”

Todavia a sua grande obra é a Cartilha Maternal, publicada em 1876, após o falhanço do Método Português de António Feliciano de Castilho.

Pela sua importância vamos dedicar uma Folha Solta a essa grande obra pedagógica que acabou por imortalizar o nome de João de Deus, principalmente junto do povo.

Deixamos aqui à esquerda o Dia de anos, em que ressalta toda a capacidade de dizer, utilizando como ninguém as palavras e, com a mais repassada simplicidade e ternura, diz tudo o que quer e de forma perfeitamente acessível ao comum dos leitores


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