sexta-feira, 27 de abril de 2012

Vantagens do ler...


Recordamos, hoje, um Livro de Leituras das velhas Quarta e Quinta Classes – o do Prof. Ulysses Machado – que foi aprovado, oficialmente, no Diário do Governo de 30 de Janeiro de 1922 e, trinta anos depois, ainda dele lemos textos e fizemos ditados.

Refere, esta 12ª edição, a ilustração da obra com 146 gravuras e dela realçamos, nesta folha solta, dois pequenos grandes pormenores: inicia-se o livro com um pequeno texto do Mestre Cândido de Figueiredo, intitulado “Vantagens do ler”, em que se faz a apologia da leitura e cujo último parágrafo, transcrevemos: “Habituai-vos, a ler bem, a ler bons livros, se quereis preparar uma existência honrada e cómoda, e ter direito à estima e ao louvor de toda a gente de bem.”

Transcrevemos, sem comentários, deste Livro de Leituras, a história de “O velho, o rapaz e o burro”, com que o Mestre e Poeta Curvo Semedo nos delicia:
                   
 I
O mundo ralha de tudo,
Tenha ou não tenha razão;
Quero contar uma história
Em prova desta asserção.
                       
VII
Apeiam-se e outros lhe dizem:
- Toleirões, calcando a lama!
De que lhes serve o burrinho?
Dormem com ele na cama?
                    
 XIII
Pegam no burro; o bom velho
Pelas mãos o ergue do chão;
Pega-lhe o rapaz nas pernas
E assim caminhando vão.
                   
 II
Partia um velho campónio,
Do seu monte ao povoado;
Levando um neto que tinha,
No seu burrinho montado.
                       
VIII
- Rapaz – diz o bom do velho
- Se de irmos a pé murmuram,
Ambos no burro montemos,
A ver se ‘inda nos censuram.
                    
 XIV
- Olhem dois loucos varridos!
Ouvem com grande sussurro,
- Fazendo o mundo às avessas,
Tornados burros do burro!
                  
 III
Encontra uns homens que dizem:
- Olha aquele que tal é !
Montado o rapaz que é forte,
E o velho trôpego a pé.
                
 IV
-Tapemos a boca ao mundo -
O velho disse – rapaz,
Desce do burro, que eu monto,
E vem caminhando atrás.
                   
V
Monta-se, mas dizer ouve:
- Que patetice tão rata !
O tamanhão de burrinho,
E o pobre pequeno à pata!
                   
VI
- Eu me apeio – diz prudente
O velho de boa fé –
Vá o burro sem carrego,
E vamos ambos a pé.
                 
IX
Montam, mas ouvem de um lado:
- Apeiem-se, almas de breu!
Querem matar o burrinho?
Aposto que não é seu!

X
- Vamos ao chão – diz o velho
- Já não sei que hei-de fazer!
O mundo está de tal sorte,
Que não se pode entender.

XI
É mau, se monto no burro,             
Se o rapaz monta, mau é,
Se ambos montamos, é mau,
E é mau, se vamos a pé!
                
 XII
De tudo me têm ralhado;
Agora que mais nos resta?
Peguemos no burro às costas                
Façamos ‘inda mais esta!                                                   
                    
XV
O velho então pára e exclama:
- Do que observo me confundo!
Por mais que a gente se mate,
Nunca tapa a boca ao mundo.

 XVI
Rapaz, vamos como dantes,
Sirva-nos estas lições;
É mais que tolo quem dá
Ao mundo satisfações.











       Curvo Semedo

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